Os fatores que levam a uma gravidez de alto risco e como prevenir alguns deles

A segunda gestação da dona de casa Fernanda de Fraia Furlan, de 42 anos, seguiu normalmente até a 20ª semana, quando ela começou a apresentar um quadro de pré-eclampsia – aumento da pressão arterial, acompanhado de excesso de proteína na urina.

Seu médico, então, prescreveu alguns medicamentos para tentar controlar o problema, mas sem sucesso. “Com 25 ou 26 semanas eu passava mais tempo internada do que em casa e, quando cheguei na 30ª, não deu mais para segurar. Minha pressão foi a 18×10 e não baixava de jeito nenhum. Como o bebê estava em sofrimento fetal, foi preciso fazer uma cesárea de emergência”, relembra.

Assim, no dia 30 de janeiro de 2009, pesando apenas 1.140 gramas, veio ao mundo a pequena Manuela. Por conta da prematuridade, do baixo peso e também por ter nascido com fenda palatina (céu da boca aberto), a menina ficou 90 dias internada na UTI neonatal do Hospital Bom Clima, em Guarulhos (SP).

“Lá, ela foi entubada, recebeu transfusão de sangue, foi alimentada por sonda, usou uma infinidade de remédios… Cada dia no hospital era uma surpresa, e os médicos até chegaram a desenganá-la, por conta de uma infecção muito forte que ela pegou. Foi um período horrível, não desejo para ninguém”, diz Fernanda.

Hoje, com 10 anos, Manuela tem seu desenvolvimento compatível com o de crianças que nasceram na “hora certa”. “Ela demorou um pouco mais para andar do que os outros bebês e era bem frágil, mas agora é super saudável, apenas tem os dentes fracos devido à quantidade de antibióticos que precisou tomar e faz tratamento com fonoaudiólogo.”

O que afeta a gravidez?

O caso de Fernanda e Manuela, infelizmente, não é tão raro nas maternidades. Para se ter uma ideia, anualmente, quase 30 milhões de bebês em todo o mundo nascem antes do tempo, com baixo peso ou adoecem e precisam de cuidados especiais, muitas vezes intensivos.

O dado faz parte do relatório “Survive and Thrive

: Transforming Care for Every Small and Sick Newborn” (Sobreviva e prospere: Transformando o cuidado para todos os recém-nascidos pequenos e doentes, em tradução livre), lançado no ano passado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef).

Mas quais são os fatores que afetam a gravidez e colocam a vida de tantos bebês em risco? De acordo com o obstetra Alexandre Pupo, membro do corpo clínico do Hospital Albert Einstein e do projeto Parto Adequado, entre os principais estão hipertensão arterial, diabetes e infecções.

Também entram na lista infecções sexualmente transmissíveis, uso de drogas ilícitas e álcool, tabagismo, viroses e arboviroses, desnutrição significativa, obesidade, sedentarismo, estresse, gestação precoce, tardia e/ou múltipla, patologias autoimunes, cardíacas, renais, tireoidianas e neurológicas e pré-natal mal feito, entre outros.

O obstetra comenta que, em toda gestação, diversos cuidados são necessários a fim de garantir tanto a saúde das mães quanto a dos fetos. “É importante que a mulher inicie o acompanhamento médico antes mesmo de engravidar. Dessa forma, ela irá se preparar tanto do ponto de vista físico e orgânico quanto emocional, e vai engravidar nas melhores condições possíveis.”

Além disso, Pupo recomenda escolher um profissional com bastante conhecimento na área, para a realização de um pré-natal de qualidade e, se possível, o parto. Segundo o especialista, é importante seguir à risca as orientações e fazer todos os exames necessários em cada etapa da gravidez.

Seus demais conselhos incluem não engordar em excesso – o ideal é ganhar entre 7 e 15 quilos durante os nove meses -, beber bastante líquido para evitar infecção urinária e manter o sangue bem diluído, praticar atividade física, ter uma alimentação saudável, diminuindo a ingestão de sódio e comidas industrializadas, e ter boa higiene bucal e genital.

Prematuridade

Entre as consequências mais importantes de uma gravidez conturbada está a prematuridade, como aconteceu com Fernanda e Manuela. A OMS considera prematuros (ou pré-termo) os bebês que nasceram com menos de 37 semanas completas – os com idade gestacional entre 32 e 37 semanas são classificados como limítrofes; os entre 29 e 31, moderados, e os entre 24 e 28, extremos.

O grande problema é que, por saírem da barriga da mãe cedo demais, essas crianças ainda não estão 100% “prontas”, ficando sujeitas a uma série de complicações que podem causar prejuízos à saúde como um todo no curto, médio e longo prazo.

“A prematuridade é a principal causa de mortalidade e doenças nos primeiros cinco anos de vida. Seus efeitos mais comuns estão relacionados com imaturidade pulmonar, cardíaca, intestinal, neurológica, metabólica, renal, hepática e de desenvolvimento”, diz Maria Albertina Santiago Rego, médica do Departamento Científico de Neonatologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) e professora do Departamento de Pediatria da Universidade Minas Gerais (UFMG).

Segundo dados preliminares do Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos (SINASC), do Ministério da Saúde, ocorreram 318.406 partos prematuros no país em 2017. Pelos números da pesquisa “Nascer no Brasil: Inquérito Nacional Sobre Parto e Nascimento”, realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), o índice de prematuridade brasileira, de 11,5%, é quase duas vezes superior ao observado nos países europeus.

“Estamos entre os 10 países com mais bebês prematuros. As taxas aqui são altíssimas, mas poderiam cair com a realização de um pré-natal de qualidade e se todas as mulheres tivessem, durante a gravidez, melhores condições de trabalho, saúde e vida”, analisa a especialista da SBP.

Baixo peso

O baixo peso dos bebês ao nascer – são considerados os com menos de 2,5 quilos – também é determinado por fatores de risco durante a gestação. O Ministério da Saúde comenta que esta é a causa isolada mais importante para a mortalidade infantil, e a cartilha “Cuidados Gerais – Atenção à Saúde do Recém-Nascido”, elaborada pelo órgão, pontua que a situação é mais comum nos extremos de idade da mãe e está em torno de 8% no país.

“As consequências disso para as crianças são diversas, podendo ir desde hipoglicemia (baixa concentração de açúcar no sangue), passando por problemas respiratórios, até transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH). Tudo vai depender da causa”, explica Nelson Douglas Ejzenbaum, pediatra e neonatologista membro da SBP e da Academia Americana de Pediatria (AAP).

O médico ressalta que, assim como acontece com a prematuridade, o adequado acompanhamento pré-natal na gravidez possibilita a identificação de eventuais riscos em tempo oportuno para intervenção.

Vale destacar que, para atendimento ao recém-nascido de baixo peso, o Ministério da Saúde preconiza o Método Canguru, cujo “objetivo é melhorar a qualidade da atenção prestada à gestante, ao bebê e sua família, promovendo, a partir de uma abordagem humanizada e segura, o contato pele a pele (posição canguru) precoce entre mãe/pai e bebê, de forma gradual e progressiva, favorecendo o vínculo afetivo, a estabilidade térmica, o estímulo à amamentação e o desenvolvimento”.

Nascimentos e mortes

Estima-se que nasçam no mundo 180 bebês por minuto. No Brasil, em 2017, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) registrou 2,87 milhões de nascimentos; em 2016, foram 2,79 milhões, e, em 2015, 2,95 milhões.

Por outro lado, cerca de 2,6 milhões de recém-nascidos morrem no mundo antes de completar um mês de vida, sendo que um milhão não resiste já ao primeiro dia. Em mais de 80% dos casos, os óbitos são decorrentes de prematuridade, complicações durante o nascimento ou infecções como sepse, meningite e pneumonia, pelos dados do relatório “Every Child Alive – The Urgent Need to End Newborn Deaths” (Toda criança viva – A urgente necessidade de acabar com as mortes de recém-nascidos, em tradução livre), publicado no ano passado pelo Unicef.

Apesar da gravidade da situação, o documento indica que a taxa global de mortalidade neonatal diminuiu de 31 para 18 óbitos por mil nascidos vivos entre 2000 e 2017 – até 2030, a meta é cair para 12 ou menos. Por aqui, pelos dados do IBGE, o índice, medido pela probabilidade de óbito até um ano de idade, foi de 12,8 em 2017; no ano anterior, fechou em 13,3.

Fonte: G1 Globo

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